Em Abril de 1521, Martinho Lutero declarou
diante o tribunal de Worms: “Não posso fazer de outro modo. Mantenho o
que escrevi. Que Deus me ajude.” Suas Noventa e Cinco Teses afixadas à porta da igreja em Winttenburg em 31 de outubro de 1517 iniciaram a
maior revolução na história da Igreja Cristã: a Reforma Protestante.( leia em mais informações)
Lutero pregara e publicara com ousadia sobre os abusos, erros e
pecados da igreja romana. Por estas e outras razões o Papa e outros
líderes da igreja Católica queriam a sua morte. Lutero continuou vivo
porque seu amigo, o Eleitor da Saxônia, Frederico Sábio, instrumento nas
mãos de Deus, o manteve no seu castelo de Wartburg onde traduziu a
Bíblia para a lingua alemã.
Em Wartburg, também pode preparar outros meios para seu povo poder
ser salvo em Cristo. Precisavam de cultos em alemão para sua
compreensão. Precisavam cantar a sua fé e louvar a Deus na sua própria
língua. Como muitos do seu povo, Lutero, a quem Hans Sachs chamou de “O
Rouxinol de Winttenberg”, amava muito a música. Tocava o alaúde e a
flauta com perfeição. Os hinos de João Huss e seus seguidores foram
traduzidos para o alemão.
Lutero escreveu em 1524 que desejava, seguindo o exemplo dos
profetas e anciãos da igreja, dar salmos alemães ao povo, quer dizer,
hinos sacros, para que a palavra de Deus pudesse habitar entre o povo
por meio do canto também. Para isso, procurou outros músicos idôneos
para se unirem a ele para providenciar esses hinos congregacionais.
Com o mui hábil músico Johann Walther, em 1524, publicou o primeiro
de muitos hinários: Geistlich Gesang Buchlein. No prefácio deste
hinário, Lutero escreveu:
“Que o cantar de cânticos espirituais é uma coisa boa e
agradável a Deus, creio eu, não é escondido de qualquer irmão… [Isto]
tem sido conhecido por todos e pela cristandade universal desde o
começo. Pois São Paulo também afirma isto em I Coríntios 14, e ordena
aos Colossenses que cantem salmos e cânticos espirituais ao Senhor nos
seus corações, para que a Palavra de Deus e o ensino de Cristo sejam
assim espalhados por toda a terra e praticados de toda a maneira. Assim,
como um bom começo e para encorajar aqueles que possam fazer melhor, eu
e outros temos ajuntado certos cânticos espirituais com o intuito de
espalhar e dinamizar o Santo Evangelho que agora, pela graça de Deus,
emergiu de novo para que possamos nos gloriar, que Cristo é a nossa
Fortaleza e Cântico, e que não conheçamos outra coisa para cantar ou
dizer senão Jesus Cristo nosso Salvador, como Paulo diz em I Coríntios
2.”
Para este hinário, Lutero empregou muitos hinos e salmos
existentes. Adaptou músicas das missas. Aproveitou das melodias
folclóricas do seu povo, com requisito que fossem apropriadas para
cultuar a Deus e que não tivessem associados com letras lascivas.
Lutero disse “Não pretendo deixar para o Diabo as melhores melodias!”
Seu bom gosto, sua musicalidade, seu estudo cuidadoso da Palavra e a
sua fé lhe deram idoneidade na escolha da música apropriada para o
culto. Calvino, porém, ensinou que a música do culto devia se limitar
aos Salmos. Outros extremistas diziam que a música, que criam ser de
Satanás, não devia ser usada nos cultos de forma nenhuma. Para esses,
Lutero replicou:
“Não sou da opinião de que, pelo evangelho, todas as artes
devessem ser banidas e lançados fora, como alguns fanáticos querem que
creiamos. Quero ver todas as artes, principalmente a música, no serviço
daquele que as criou e no-las deu. A música é a bela e gloriosa dádiva
de Deus… A música transforma os homens em pessoas mais gentis, mais
auto-controladas e mais razoáveis.”
De grandes ameaças e sofrimentos nascem os nossos melhores hinos. O
primeiro hino de Lutero, consagrado a dois frades martirizados,
intitulou-se 'O Cântico dos Dois Mártires de Cristo em Bruxelas,
Queimados pelos Sofistas de Louvain'. Seu hino inigualável, 'Castelo
Forte', foi escrito “na hora mais escura na história deste movimento”.
Perseguições da parte do Imperador Carlos V ameaçavam a existência
dos chamados “Protestantes”. Lutero mesmo sofria ameaças de morte à toda
hora. Sofria fisicamente, também. Quando foi acometido pela “praga” que
ceifou muitos dos seus irmãos na fé, deu as suas despedidas à sua
família. De novo, Céus tinha outro plano para Martinho Lutero.
Este hino, escrito em 1529, em Coburg, foi o chamado à batalha de Lutero. James Moffatt chamou-o de “o maior hino, do maior homem, do maior período da história da Alemanha”.
Foi cantando com emoção e sinceridade ao longo desses quase quatro
séculos, em milhares de línguas. Define até onde podemos confiar em
nosso Castelo Forte, nosso Escudo e Boa Espada. Mostra, também , quem é o
nosso inimigo; o Tentador, com seus demônios, contra os quais em nós
mesmos não há força para resistirmos. Mas, Cristo o venceu na cruz. Quem
nos defende é o Senhor dos altos céus, o próprio Deus. O grande
acusador cairá com UMA SÓ PALAVRA!
John Julian, no seu Dicionário de Hinologia declara: “Lutero é o
Ambrósio da hinódia alemã. Ele é o primeiro hinista evangélico. A
Lutero pertence o mérito extraordinário de ter dado ao povo germânico no
seu próprio idioma, a Bíblia, a Catequese e o hinário, para que Deus
pudesse falar com eles diretamente pela sua palavra e que eles pudessem
responder a Ele nos seus cânticos!”
Seus hinos são caracterizados por simplicidade e força, e um tom
considerado ‘tom da igreja’ pelo povo comum. Ele tinha a extraordinária
habilidade de expressar profundos pensamentos em palavras bem claras.
Nesta característica ninguém o sobrepujou. Esse foi o segredo do seu
poder. Ele nunca deixou a o leitor uma dúvida quanto a o que ele quis
dizer. Entregou a verdade bem no coração do povo comum. Como o afamado
Ruy Barbosa, sempre usou a palavra certa no lugar certo. Ele nunca
perderá seu domínio sobre o povo da fala germânica.
Lutero ainda precisando de novos salmos e hinos, escreveu para Spalatinem 1523: “É
meu plano… escrever salmos no vernáculo para o povo… Procuramos em
todos os lugares por poetas… Mas desejo que expressões “da moda e da
Corte” sejam evitadas e que as palavras possam todas ser muito simples e
comuns para que o povo comum possa compreender, entretanto manejadas
com arte e pureza”.
Um artigo em 1935 do jornal O Estado de São Paulo sobre o assunto musical, dizia o seguinte: “Cabe a Martinho Lutero realmente a celebridade de popularizar o 'Lied' (no plural Lieder - é uma palavra da língua alemã, de gênero neutro, que significa "canção") eclesiástico.
Ele, o fixador da língua alemã… não se contentou em traduzir a Bíblia
para o alemão, mas utilizou-se da musicalidade alemã acordada pelos
Mestres Cantores e fez cantar em alemão na sua igreja os salmos e outros
textos litúrgicos. Ele mesmo atuou como compositor e em 1524 aparecia
em Choralbuch, cujas melodias em grande parte são obra de Lutero. A
simplicidade, a interioridade de seus 'Lieder' religiosos são
incomparáveis. Muitos outros de seus 'Lieder'… são cantados ainda hoje”.
Lutero “havia dado mais do que nenhum outro dera jamais ao seu povo – a língua, a Bíblia, a hinologia", escreveu Bill Ichter, no primeiro volume da revista Louvor, em 1980.
Este hino conhecido como “A Marselhesa da Reforma”, conserva até
hoje o seu poder e poderíamos usá-lo ainda em outro conflito semelhante.
. . Há pelo menos 53 traduções em inglês, merecendo todos os destaques
no Dicionário de Hinologia de John Julian… Sua melodia, de acordo com
McCutchan, "é excelente em todos os sentidos. É empolgante e tem dignidade, unidade e autoridade raramente igualadas”.
Basta dizer que são muitos os compositores que têm usado trechos
desta melodia em suas obras. Ente eles, podemos citar J. S. Bach,
Wagner, Mendelssohn, e Meyerbeer. Julian registra nove principais
hinários que Lutero publicou para as igrejas alemãs. Sua lista também
inclui onze traduções do latim, quatro hinos populares da Pré–Reforma
revisados por Lutero, sete Versões dos Salmos, seis paráfrases de outras
porções das Escrituras, bom como oito hinos basicamente originais, além
de algumas músicas corais adaptadas de textos católicos – o total de
tinta e oito.
Em 1523, em Bruxelas, dois jovens, cujo único crime fora a sua
profissão de fé na nova doutrina, foram queimados. Em honra a esses dois
mártires, Lutero escreveu e compôs a música do seu primeiro hino:
Castelo forte é nosso Deus, o qual é uma paráfrase do Salmo 46:
Deus é o nosso refúgio e fortaleza, socorro bem presente na angústia. Pelo que não temeremos, ainda que a terra se mude, e ainda que os montes se projetem para o meio dos mares; ainda que as águas rujam e espumem, ainda que os montes se abalem pela sua braveza.
Martinho Lutero é, por assim dizer, o 'pai do canto
congregacional', pois antes disso a congregação não tinha o costume de
cantar hinos. Os poucos hinos que havia eram cantados em latim, somente
pelos oficiais da igreja. Foi ele que introduziu o cântico por toda a
congregação!
'Castelo Forte' foi considerado como a “Marselhesa da Reforma”,
porque todos os cristãos da Reforma cantavam-no com o mesmo entusiasmo
dos patriotas da França. Ele era cantado diariamente por Lutero e por
seus companheiros. Até os inimigos da Reforma diziam: “O povo inteiro está cantando uma nova doutrina”.
Assim, este hino cooperou muito no desenvolvimento da Igreja cristã
naqueles dias. Foi tão grande a repercussão que homens ilustres,
artistas e músicos de fama usaram-no nos seus temas: o exército de
Gustavo Adolfo cantou-o antes da Batalha de Leipzig, em Setembro de
1631; Meyerbeer usou-o como tema de sua ópera de fundo religioso, “Os
Huguenotes”; Mendelsohn usou-o na sua “Sinfonia da Reforma”; Wagner
utilizou-o em “Kaiser-Marsch” e J. S. Bach também o usou numa de suas
cantatas sacras.
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